ESCREVER BEM PARA LER MELHOR: O Clube de Escrita Criativa da Biblioteca Municipal de Lagoa

Clara Andrade (Biblioteca Municipal de Lagoa)

“…não me arrependo de nenhuma hora que passei a escrever. A minha mente de escritor encontrou aí o seu jogo favorito, o seu lugar mais prazenteiro; ao deixar a imaginação fluir, fui mais feliz do que em qualquer praia paradisíaca na qual, ao fim de cinco minutos já não saberia o que fazer comigo próprio.”
(João Tordo)

De uma forma geral, designa-se por escrita criativa o modo de escrita literária ou o processo através do qual se produz literatura, e que inclui o estudo e exercício prático de romances, contos, novelas, poemas, textos dramáticos… 

Nos diferentes tipos de escrita, a criativa ou literária, distingue-se, assim, por envolver o domínio da imaginação e a criação de textos de ficção, separando-se, portanto, da escrita profissional, jornalística, técnica ou científica. Embora praticados há muito tempo, os cursos ou oficinas literárias só se formalizaram no século XX, sobretudo nos Estados Unidos - creative writing. Hoje são uma prática comum e acontecem por todo o lado, tanto em meio académico como em outras instituições, como é o caso do Clube de Escrita Criativa da Biblioteca Municipal de Lagoa.

Foi em outubro de 2015 que, com uma oficina de escrita, iniciámos o projeto. Repetido nos mesmos moldes em 2016, estas sessões, de realização pontual e de grande sucesso, deram origem ao Clube de Escrita Criativa: dado o agrado e entusiasmo dos participantes foi lançada a ideia de transformar este projeto isolado num projeto de continuidade, de periodicidade semanal com duração de duas horas, e sem fim à vista. Conduzido e ministrado pelo orientador David Roque - professor e escritor -  o Clube tem já 7 anos de vida.

O Clube integra à volta de 30 inscritos, com uma média de 15 pessoas por sessão. O grupo inicial tem-se mantido firme ao longo do tempo, mas há alguma mobilidade de entradas e saídas, circunstância que refresca e enriquece a dinâmica do grupo. A média de idades é de 50 anos.

As sessões iniciam-se com uma parte teórica, seguida de exercícios práticos de escrita, apoiados em diferentes modelos e estratégias. O objetivo é escrever, treinar e desenvolver competências de escrita. Só escrevendo se aprende a escrever e a desenlaçar os nós para expressar o que se sente e revelar a voz única e preciosa que cada um guarda dentro de si, procurando o lugar de onde brotam as palavras - o sagrado -, como tão bem diz João Tordo (2020, p. 77). Só assim, pela experiência de escrever, de errar, de errar menos, de escrever melhor é que se acerta, às vezes. É um trabalho de Sísifo, como viver. É um trabalho de feitiçaria, de magia: ouvir as vozes que falam, cantam ou gritam e fazer delas matéria visível, escrita. Trabalhar e escavar, trazer a palavra certa do lugar recôndito da sua nascente. O mesmo lugar onde a verdade se esconde e, às vezes, esplendorosamente se mostra. E ler, ler muito. Por isso, que melhor lugar para este Clube senão numa casa de livros como a Biblioteca.

E depois, há os livros editados de autores que integram o Clube cujas práticas e aprendizagens ajudaram a tornar possível. São, pois, já bastantes os que neste momento escrevem e publicam.

Inserido na missão e nos objetivos da Biblioteca, onde se destacam a promoção do livro e da leitura, o incentivo e o acesso ao saber, à cultura, à educação e ao lazer, o Clube de Escrita Criativa é um lugar onde o conhecimento se dá pela mão da escrita e, concomitantemente, da leitura. É um lugar de treino e aprendizagem, de debate, de partilha. É, sobretudo, um lugar de reunião e convívio prazeroso. Um lugar de inclusão, porque ninguém é excluído e de proximidade com a comunidade. Um lugar ameno de respeito pela fala e pela escrita do outro, portanto, um lugar de exercício de uma cidadania plena, ativa e consciente, de fortalecimento da democracia e dos valores civilizacionais que queremos melhorar.

Mas é, sobretudo, um lugar de encontro e de alegria.

Bibliografia:Tordo, João (2020). Manual de sobrevivência de um escritor ou o pouco que sei sobre aquilo que faço. Lisboa: Companhia das Letras.

JANEIRO 2023

 

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